Barbara Solon
3 min readDec 5, 2023

A Neurose Obsessiva e a Perversão

Antes de falarmos de tipos clínicos, escutamos sujeitos. Por isto adianto que este texto pretende fazer uma aproximação entre a neurose obsessiva e a perversão, mas alertando que existem as neuroses obsessivas e as perversões, no plural. Dito isso,

As perversões causam horror porque reflete no olhar do observador, a imagem que este dissimula.E não há melhor observador que o obsessivo.

Começaremos pela questão materna:

Quais os efeitos de sentir-se amado demais pelo Outro, em especial aquele que exerce a função materna? O perverso e o obsessivo possuem essa questão em comum e tratam dela com respostas distintas. Eu poderia até dizer que a resposta do perverso é desmentir a castração e a do neurótico é recalcar. Mas eu acho isso uma devolutiva muita batida e que não explica muita coisa.

Vou me agarrar com Joel Dor (1991), e dizer que tanto o obsessivo quanto o perverso tem um excesso de amor de quem exerce a função materna. O obsessivo lida com isso ao responder à falta da mãe como uma demanda a ser satisfeita, e o perverso responde à falta da mãe pela identificação com o objeto que ele supõe que vai preservar a mãe fálica. Ou seja:

O neurótico obsessivo faz suplência ao desejo da mãe e o perverso faz suplência ao objeto de desejo da mãe. Ambos sentem-se privilegiados, mas só um o suficiente a ponto de se autorizar a transgredir a lei que opera a falta materna.

Para transgredir uma lei, é necessário ter uma lei, ou pelo menos, minimamente reconhecê-la. Desta forma, o perverso não está menos submetido a lei do que o neurótico obsessivo. E ainda ouso dizer que ambos se utilizam de uma ritualização como forma de lidar com o desejo que advém dessa operação simbólica.

O ritual do neurótico obsessivo visa neutralizar o desejo e o ritual do perverso visa subtrair o desejo.

Eu concordo particularmente com Stoller (1975) e encaro que a perversão tem seu ritual, porque de fato, para se defender da angústia de castração, o perverso ele vai se utilizar de uma cena fixa, que deve estar sob controle para poder converter a cena traumática infantil em triunfo adulto. O perverso não age necessariamente por impulso, mas compulsivamente (repete a mesma cena), preservando o falo imaginário por meio do objeto fetiche. Até aqui você notou alguma semelhança? Deixa que eu conto.

Essa questão da compulsão e do controle, são semelhanças na neurose obsessiva e na perversão. Ambos, agem compulsivamente, no sentido, de repetir determinadas práticas. O obsessivo o faz porque acha que seus pensamentos podem se tornar realidade e cria rituais como forma de controlar e defender-se de suas satisfações ‘’proibidas’’, e o perverso o faz porque não pensa, só age como forma de preservar suas satisfações ‘’proibidas’’. Nesse esquema ambos se satisfazem, mas a que custo?

O custo é que para preservar esse engodo é preciso ter controle sobre o outro. Ora, tanto o perverso quanto o neurótico obsessivo em suas relações instrumentalizam o outro e o reduzem a objeto inanimado. A diferença é que o perverso o faz para gozar e o neurótico obsessivo o faz para se organizar (Rosa Jr., 2013).

Enquanto no obsessivo o outro como objeto é idealizado para que este não tenha que se haver com a falta, o perverso tem o outro como objeto infame, que precisa da falta para ser completado. O neurótico obsessivo vai pela via do saber operar o aniquilamento da alteridade do outro para não perdê-lo, o perverso pela via do saber vai acreditar que a fantasia do outro se constitui da mesma forma que a sua, não concebe alteridade não porque precisa controlar, mas porque acredita estar no controle.

Kant com Sade não foi à toa afinal.

REFERÊNCIAS

DOR, Joël. Estruturas e clínica psicanalítica. Trad. Jorge Bastos e André Telles. Rio de Janeiro: Taurus-Timbre, 1991

FARIAS, Camila Peixoto; CARDOSO, Marta Rezende. Compulsão e domínio na neurose obsessiva: a marca do pulsional. Psicol. clin., Rio de Janeiro , v. 25, n. 1, p. 117–128, jun. 2013 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-56652013000100008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 05 dez. 2023.

ROSA JR, N. C. D. DA. Perversão e filiação: o desejo do analista em questão. 321f. Tese (Doutorado em Psicologia Social e Institucional). Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre: 2013.

STOLLER, R. J. (1975).Perversão: a forma erótica do ódio. 2. ed. São Paulo: Hedra, 2018